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Posts sobre física de partículas, teórica e experimental.

Nobel 2015: Oscilações de caráter

Rookie

Edição 06 de outubro de 2015: Esse tópico foi recompensado com o prêmio nobel da física de 2015 aos cientistas Arthur B. McDonald e Takaaki Kajita, absolutamente merecido. Reaproveito esse post de 2012, em um foreshadowing exemplar de minha parte, e mando-o para o dia de hoje. Parabéns à física de partículas, vocês ganham esse round.

A predição e descoberta dos neutrinos na segunda metade do século XX foi uma das grandes conquistas da física de partículas e da astrofísica. Pequenos, rápidos e quase indetectáveis, esses pequenos diabos roubam a energia das explosões de supernovas e bombardeiam outras galáxias, atravessando o espaço em uma velocidade próxima à da luz. A Terra é bombardeada o tempo todo por uma quantidade colossal de neutrinos, felizmente eles interagem muito pouco com a matéria e, até tentando, é difícil detectar um. Os caçadores de neutrinos, em especial o Super Kamiokande – um detector de neutrinos com nome de herói japonês que, não por menos, é parte da Universidade de Tóquio – possuem um trabalho duro. Em 1987, ano da explosão de uma supernova próxima à Terra, nosso planeta foi atingido pela maior onda de neutrinos da era da ciência moderna, detectamos 24.

Interior do Super Kamiokande

E medidas mais precisas do número de neutrinos quase levaram a comunidade física à loucura no final do século XX. A física teórica, aliada a alguns experimentos na Terra, nos dizia exatamente a probabilidade de medir neutrinos, a astrofísica nos dizia a quantidade de neutrinos produzida pelo Sol, era só multiplicar um pelo outro para estimar a quantidade de neutrinos que seríamos capazes de medir na Terra a cada ano. O problema: medíamos muito menos do que deveríamos.

Diversas hipóteses foram levantadas: neutrinos perdidos na atmosfera, detectores que funcionavam mal, nada era o suficiente para explicar a diferença. Claro, a diferença era entre medir 12 e 24, mas, por menor que fossem esses números, um ainda era o dobro do outro; e a física é bem intolerante com teorias que “quase funcionam”.

Pior, essa diferença variava com o ano. Havia uma grande diferença entre o número de neutrinos medidos em julho e em janeiro, mas entre dois janeiros consecutivos a taxa de captação de neutrinos era quase equivalente. Ainda, nos dois casos, o número era praticamente metade do esperado, e isso aumentava o mistério. Coloco um gráfico para entender a diferença entre o recebido e o esperado. As barras em azul escuro são as medidas, as mais coloridas são as esperadas (as cores nas barras teóricas representam o processo pelo qual os neutrinos são emitidos). A parte hachurada representa o erro experimental.

Antes de solucionar o mistério, precisamos entender um pouco sobre o neutrino e sobre as partículas. A maior parte das partículas elementares (os férmions, para ser exato) vêm em três tipos, ou três sabores: leve, médio e pesado. O elétron, por exemplo, é o membro leve da sua família, seus irmãos maiores são o múon (médio) e o tau (pesado). Não ouvimos falar muito dos membros mais pesados da família porque a formação deles é mais rara no universo, sendo mais pesados, eles são mais difíceis de serem “fabricados”. Neutrinos vêm em três tipos, nós definimos esses tipos através do método de formação deles, porque neutrinos sempre se formam em uma reação que envolve alguém da família do elétron. Os neutrinos que saem de uma reação com o elétron são chamados, por falta de criatividade, de “neutrino do elétron”, sendo os outros “neutrino do múon” e “neutrino do tau”. Retirei do site particlezoo uma representação dessas partículas elementares em pelúcia:

No começo dos anos 2000, os físicos decidiram tentar algo diferente. Eles tentariam captar todos os tipos de neutrino, não apenas o do elétron, como vinham fazendo até então. A experiência parecia fadada ao fracasso, porque o Sol só produz neutrinos do elétron, os demais que apareceriam seriam raros demais, vindos de processos exóticos em estrelas longínquas. Para o espanto da comunidade científica, a quantidade de neutrinos do múon que atinge a Terra é quase igual a dos neutrinos do elétron. Usando a soma de todos os tipos de neutrino, aquelas barras “esperado” e “medido” coincidiam!

Mas como explicar isso? A única forma de explicar foi compreender o fenômeno de oscilação de neutrinos. Lembro que as partículas elementares não são como aquelas pelúcias fofinhas, elas não precisam obedecer às regras da física “convencional” e não o fazem. Um neutrino, quando é produzido em uma reação com um elétron, é um neutrino do elétron, mas só naquele momento. Durante seu “voo” até a Terra, ele não é nem neutrino do elétron, nem do múon, nem do tau, ele é um neutrino. Quando nós o capturamos, ele tem uma certa probabilidade de reagir com um elétron e uma certa probabilidade de reagir com um múon, e nisso damos o nome para ele. Mas note que ele não é nenhuma dessas categorias, mas um estágio intermediário entre elas que, quando medimos, “escolhe” qual estado será.

Isso é bem confuso e analogias são difíceis. Qualquer analogia que explica bem a mecânica quântica está errada, mas vou tentar assim mesmo. O neutrino, nesse sentido, é como um cilindro, mas somos apenas capazes de medir objetos de um jeito estranho: imagine que conseguimos pintar o cilindro com tinta e, em um dado momento, colocá-lo em um papel e medirmos a figura que ele “pinta” com a tinta. Em seguida, tentaríamos entender o que é esse objeto através de nossos conhecimentos de figuras planas. Imagine que o cilindro está girando, rodando no ar de forma aleatória. Quando batemos o cilindro no chão e estudando sua mancha, ela tanto poderá ser retangular (a marca do “lado” do cilindro) quanto poderá ser circular (a marca da base do cilindro), tudo depende da posição em que ele estiver rodando. Os neutrinos agem de forma parecida, eles são uma mistura dos três estados (elétron, múon e tau) e, quando os medimos, eles se manifestam de uma forma na experiência. Porque nossa compreensão do neutrino é apenas o que medimos quando ele é produzido ou aniquilado, damos a ele esses nomes; assim como se só fôssemos capazes de medir a mancha diríamos que o cilindro é um objeto que está no estado círculo e no estado retângulo ao mesmo tempo, “escolhendo” um desses estados quando vamos medir sua marca de tinta.

Com isso, o mistério da variação no ano está resolvido. A probabilidade de encontrar um neutrino no estado elétron ou múon varia de acordo com seu tempo de voo, há pontos de sua trajetória em que ser do elétron é mais provável que ser do múon. Mas a Terra gira em torno do Sol e a distância entre nós e o astro rei varia com o ano (estamos mais próximos do Sol em janeiro e mais afastados em julho), não o suficiente para afetar muito o clima, mas essa diferença na distância dá mais tempo de voo aos neutrinos e afeta suas probabilidades, tornando a repartição elétron-múon diferente em cada momento do ano mas, entre um janeiro e outro, o  comportamento deve ser o mesmo.

Vale notar que os experimentos para medir neutrinos, essa “partícula-fantasma”, acontecem desde os anos 60, e dou destaque especial às experiências de Raymond Davis, prêmio Nobel de 2002 por seus experimentos. Davis transformou uma antiga mina de ouro em South Dakota em um grande detector de neutrinos. A medição era feita usando colisões de neutrinos com átomos de cloro, a mina era necessária para isolar o experimento de raios cósmicos que podiam parecer neutrinos, e todo ele era cercado por água, o que garantiria que só neutrinos atingiriam o cloro. A mina podia ficar bem quente em algumas épocas do ano, por isso coloco aqui uma foto de Davis nadando na água de seu experimento.

Raymond Davis Jr. Nobel da física de 2002.

E isso soluciona o mistério dos neutrinos desaparecidos e abre um capítulo interessante para entender a natureza das partículas elementares e esse tal fenômeno de oscilação. Nem tudo é o que parece, em especial os neutrinos, que são, na verdade, uma mistura de tudo o que deles podemos medir.

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A meu engenheiro químico favorito

Rookie

Esse post foi escrito a um grande amigo, quando este ano passado prestou o curso de engenharia química e passou. Apesar de nossas rivalidades, engenharia química é a fusão de duas rixas velhas de estudantes da graduação de física, aprecio e admiro o trabalhos desses cientistas.


A meu engenheiro químico favorito.

Como você deve saber, físicos e químicos possuem aquela rivalidade saudável entre duas ciências bem resolvidas. Ambas são torturadas durante o ensino médio, ambas são detestadas por todos os seus amigos menos eu e ambas, durante sua aprendizagem até a faculdade, contam muitas mentiras. Certo, admito que mentira é uma palavra forte, seria mais educado dizer que os ensinamentos são incompletos e imperfeitos, porque quem tem problemas com U=R.I dificilmente conseguirá apreciar a quântica. Não porque ela é difícil, mas porque ela exige base, maturidade científica, sobriedade no raciocínio; nenhuma matéria na física é realmente difícil se você possui esses três elementos ((Exceto mecânica dos fluidos. Mecflu é só crueldade.)) .

E tem algumas coisas que eu queria compartilhar com você nesse ingresso de faculdade, coisas que demorei a aprender e entender, e que mudaram a maneira como vejo o mundo. Elas envolvem os tijolos de suas futuras construções teóricas: os átomos. Química é a arte de explicar o que acontece quando dois átomos ou mais se juntam, dessa pergunta saem tantas grandes realizações do século XX: o plástico, o poliéster, tantos medicamentos, cosméticos e cada pixel da tela de seu computador. Química estuda $n$ átomos juntos, formando moléculas, compostos, colóides, sempre com $n>2$. Isso porque se $n=1$, a bola ainda está no território da física.

Confesso que isso não é completamente verdade, porque o átomo de Hélio, por exemplo, já representa um desafio hercúleo para um físico calcular, sendo necessários os melhores computadores atuais para conseguir boas respostas para a perguntas que fazemos sobre esse gás nobre. Quem realmente é a prata da casa é o hidrogênio, nosso átomo favorito, pois possui apenas um elétron. Não temos nada contra prótons, eles podem aparecer em números grandes, nosso problema é com os elétrons. Neste breve texto, vou comentar algumas coisas legais que conheço dos três elementos do átomo de hidrogênio: o elétron, o nêutron e o próton. Com isso em mente, você deixa sua imaginação livre para formar quantos compostos, moléculas, redes, estruturas, plásticos e remédios você quiser.

Como você imagina um átomo? Essa é a primeira imagem que o Google nos dá quando buscamos “átomo de hidrogênio”:

Essa é a visão tradicional do átomo, aquela do ensino médio. Quando você aprende um pouco mais de física ou química, descobre que nada é parecido com esse pequeno sistema planetário que nosso professor desenha na lousa, que a palavra “camadas” faz bem menos sentido do que você imagina. Vou tentar construir aos poucos a ideia do átomo de hidrogênio, começando pelo elétron no post de hoje.

Por enquanto, esqueça tudo o que sabe do átomo. Imagine apenas um ponto central, que chamamos de núcleo. Nele moram prótons e nêutrons, mas vamos ignorar isso por enquanto. Em volta desse núcleo há uma carga negativa, que chamamos de elétron. Sabemos que ele está lá porque somos capazes de medi-lo, podemos jogar um fóton (que é, grosso modo, um pouco de luz) e veremos que o fóton é rebatido em algum ponto em torno do núcleo. Esse ponto era a posição do elétron quando foi atingido. Como de costume, e mediante protestos, o elétron será azul e o próton vermelho.

atom_1Eu posso me perguntar se existe a noção de órbita do elétron, posso querer saber por onde ele passa e para onde vai. Eu efetuo 100 medidas da posição do elétron, terei algo parecido com isso:

atom_2Os pontos azuis são agora medidas do mesmo elétron, em momentos diferentes. Como é fácil perceber, fica bem difícil falar em órbita, e fica ainda mais difícil acreditar naquele desenho dos círculos perfeitos. Para garantir, vamos tomar 1000 medidas da posição do elétron:

atom_3Isso é o registro da posição do mesmo elétron em vários momentos diferentes, o que nos obriga a repensar bastante sobre o que sabíamos do elétron. Por esse e alguns outros motivos, passamos a algumas noções mais radicais sobre as partículas elementares: A noção de trajetória já era. Não apenas não podemos dizer que ele gira em círculos, não podemos nem dizer que ele gira, nem podemos falar de sua trajetória, pois nem sabemos se existe uma.

Você pode objetar dizendo: mas é claro que existe uma trajetória, ela só é muito complexa. E por mais que isso pareça razoável e você queira que seja verdade, nenhuma evidência que temos aponta para esse lado. O máximo que podemos dizer do elétron é que ele tem uma probabilidade maior de ser medido próximo do núcleo que longe do núcleo, afinal, você percebe que a maior parte das medições caiu na zona vizinha ao próton. Podemos descrever qual a probabilidade de ele ser encontrado a uma dada distância do centro.

atom_4Essa figura é uma densidade de probabilidade, não é difícil de ler. Se você quer saber qual a chance do elétron estar em uma região entre $r_a$ e $r_b$, basta calcular a área da curva entre esses dois pontos e essa será a probabilidade.

atom_5Ou seja, a chance do elétron estar, em uma medida, entre $r_a$ e $r_b$ é a área da região azul. Notamos que há um pico nessa probabilidade, os valores perto desse pico são os mais prováveis. O raio que possui a maior probabilidade é chamado raio de Bohr, e, em muitas aproximações, o átomo pode ser considerado uma esfera maciça cujo raio é o raio de Bohr.

O mais agoniante nisso tudo é que essa densidade de probabilidade é toda a informação que temos sobre a posição do elétron, e a física, como é escrita hoje, parece nos indicar que esse é o máximo de informação que teremos nessa área da vida do elétron. O desenho do ensino é bem intencionado, porque seria difícil ensinar a alunos do ensino fundamental e médio (e também seria difícil cobrar em prova) que há muito que não sabemos e não poderemos saber, e que isso não é um problema. A ciência não é feita de verdades absolutas, mas de verdades em construção, modelos que se aproximam cada vez mais da realidade. Na física quântica, podemos apenas encontrar as probabilidades das partículas estarem onde as medimos, e isso já é bastante informação a respeito delas.

Se você der mais energia a esse elétron, dizemos que ele mudará de camada. Em um primeiro momento, ele absorve uma quantidade precisa de energia, nem mais, nem menos, e passa a ser medido em uma região idêntica à anterior, mas com a possibilidade de ir mais longe. É meramente um aumento no raio de Bohr, chamamos essa situação de um elétron na camada 2s. Se você dá mais energia ao elétron, ele começa a se comportar de um jeito bem diferente. A próxima camada, chamada 2p, é dramaticamente diferente. Se eu medisse um mesmo elétron em torno do átomo de hidrogênio mil vezes, e se esse elétron estivesse na camada 2p, esse seria um resultado possível de minha medida:

atom_7Note que eu continuo tendo uma preferência a estar perto do núcleo, mas noto que o elétron parece gostar mais de estar ou do lado de cima ou do lado de baixo, é quase impossível encontrar elétrons no anel lateral do átomo! Volte àquele desenho inicial e reflita sobre como ele é problemático. Os elétrons não giram em torno do átomo, a noção de trajetória nem existe, conseguimos apenas definir essas formas de probabilidade de medir o elétron em um lugar ou outro. Essa forma é a superfície na qual é igualmente provável encontrar um elétron. No caso das camadas 1s e 2s, essa superfície é uma esfera. A chance de encontrar um elétron afastado de uma distância $a$ do núcleo é a mesma para todos os lados, por isso dizemos que o orbital dessas camadas é uma esfera. No caso da 2p, vemos que essa forma muda, e ela será parecida com isso:

Com isso, em um abuso de linguagem, dizemos que o elétron “mora” nesses orbitais. A definição de orbital, contudo, não é o confinamento dos elétrons, mas as regiões equiprováveis de presença do elétron. Sabemos que a probabilidade de encontrar um elétron diminui exponencialmente quando nos afastamos do núcleo. ((Não estou usando exponencialmente como sinônimo de “grande” ou “bastante”, é literalmente exponencial!))

Quando você estava no cursinho, deve ter ouvido falar desses orbitais e das formas bonitinhas. Esse post é para tratar orbitais e elétrons de forma mais coerente com o que sabemos hoje em física, falando da incerteza da posição, a ausência da trajetória, as medidas de probabilidades, é isso o que sabemos sobre o elétron. Uma molécula envolve muitas vezes o compartilhamento de elétrons, e um orbital partilhado terá uma forma bem mais exótica que essas apresentadas pelo átomo de hidrogênio. Conforme você dá mais energia para o elétron, ele começa a poder ser encontrado mais longe do núcleo e, ao mesmo tempo, assume as formas mais estranhas de orbitais. Quando você vê um desses desenhos de orbitas, pense: a chance de eu encontrar um elétron é a mesma em todos os pontos dessa superfície.

A origem dessas formas é a equação de Schrodinger, uma equação diferencial bem complicada que só pode ser resolvida exatamente para o caso de um elétron. Para mais elétrons, ou moléculas, ainda conseguimos resultados numéricos, ou seja, chicoteamos o computador até ele calcular essas formas com precisão para as moléculas que queremos. Mas fórmula exata, dessas bonitinhas que se cobra em prova, não temos, nem sabemos se existe.

Outra propriedade interessante dos orbitais, e dos elétrons em geral, é o princípio de exclusão. Tome, por exemplo, o orbital 2p, essas duas gotas. Se você tiver três elétrons em um átomo com a energia desse orbital, cada elétron ocupará um orbital em uma região diferente, serão ocupados os orbitais 2px, 2py e 2pz. Se você juntar outros três elétrons, cada elétrons entrará em um orbital e esse será o limite de ocupação. Você nunca consegue colocar mais que dois elétrons por orbital! Por mais que você tente calibrar seu elétron para entrar no orbital 2p, ele não será absorvido. A razão eu já mencionei uma vez quando disse o quanto me impressionava o princípio de Pauli, um dos resultados mais profundos e misteriosos da física.

Ao final do dia, o desenho tem um mérito. Ele representa camadas mais energéticas com círculos maiores, como se o elétron girasse com um raio maior. Isso não é verdade, ele não gira e não tem raio, nem trajetória tem, mas em camadas mais energéticas a chance de encontrar o elétron mais distante do núcleo é maior, como se ele tivesse mais “velocidade” e pudesse passear mais longe antes de ser puxado de volta para o núcleo.

E isso encerra o que queria te contar sobre o elétron, e espero que isso te guie um pouco por suas primeiras aulas de química, e te prepare para a desconstrução daquilo você você achava que sabe e que, como verá, ninguém parece saber.

Nobel 2012 – Medindo sem destruir

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Eu estava em uma conferência no centro da França sobre física estatística quando recebemos a notícia do prêmio nobel, o auditório explodiu em aplausos, ainda que o premiado não estivesse entre nós. Não aplaudiram o cientista, provavelmente, mas o que ele representa: reconhecimento da comunidade científica a uma área, um raciocínio, uma ideia, muito mais que uma pessoa. Conhecido da maior parte dos conferencistas daquele evento, esse gigante na física experimental certamente merece os aplausos, e mais outros, que virão. Dedico o post de hoje ao prêmio nobel da física de 2012, o mago dos fótons e íons e pesquisador do laboratório Kastler Brossel, Serge Haroche. Também necessário dizer, também ao outro ganhador do prêmio, David Wineland.

Antes, assistir ao seguinte vídeo é necessário:

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=2dRr-fnPCwM]

Dificilmente consigo explicar melhor que isso, mas vou tentar dizer coisas a mais do que isso. Há uma diferença sutil entre os trabalhos de Haroche e Wineland. É uma simetria bonita: o primeiro lança partículas para medir a luz, o segundo usa a luz para medir partículas. A razão desses experimentos, e a grandeza deles, não é apenas conseguir medir a luz sem a destruir, como o vídeo nos conta, mas provar algo mais profundo: que ao medir um estado quântico, a própria régua que usamos para medir é afetada.

Um estado quântico, que é como chamamos a situação em que se encontra a maior parte das coisas muito, muito pequenas, não é o que medimos. Por mais estranho que isso possa parecer, um estado quântico pode ser algo como A+B e, ao medirmos, podemos encontrar A com uma probabilidade e B com outra. É aquela história do gato de Schrodinger, que pode estar vivo e morto ao mesmo tempo; só saberemos ao abrir a caixa, ao fazer a medida. Um átomo pode estar em uma situação dessas, em um estado entre dois níveis de energia, sem necessariamente “escolher” um até que a medida seja feita. Haroche e Wineland foram capazes de, usando fótons e caixas super-refletoras, medir o estado desse átomo sem precisar fazê-lo “escolher” entre um dos dois níveis de energia. Basta lançá-lo em meio a fótons, partículas de luz, que o átomo se mesclaria aos fótons, conduziria as partículas de luz a um estado coerente com o estado do átomo e, para medir o átomo, bastaria medir os fótons. É como medir a velocidade de um barco através das ondas que ele forma na água, sem precisar parar o barco para perguntar o que consta no velocímetro.

Esse tipo de medida preservando o estado quântico de “indecisão” dos átomos é fundamental para uma aplicação em particular: a computação quântica. Eu teria que escrever um post com bastante calma sobre isso, mas o princípio do computador quântico reside nessa ideia de “indecisão” dos estados quânticos entre duas situações, forçar o sistema a escolher um dos estados seria destruir toda a vantagem de se ter um computador quântico. Decerto, a computação quântica ainda engatinha, os experimentos de Haroche e Wineland datam de 1995, desde então as coisas avançaram mais.

O comitê do prêmio Nobel de física, mais uma vez (como no caso de 2010), prestigia uma área científica nova, recente, pesquisadores ainda ativos, com o prêmio máximo da ciência. Merecidamente. Haroche e Wineland, com grande intuição experimental e realização impecável das experiências, ganham lugar ao lado dos maiores na física, gigantes experimentalistas, mestres do mundo do muito pequeno.

Data venia

Rookie

É o terceiro post seguido em que cito a ciência na mídia, peço desculpas por não comentar um problema interessante de matemática ou um fenômeno bonito em física, mas, dessa vez, um problema sério e um fenômeno nada bonito. Li na Folha a excelente resposta do físico Marcelo Knobel aos comentários do ex-presidente do STF Ayres Britto sobre física quântica e espiritualidade. Eu dificilmente teria me expressado de forma mais clara que Knobel, e faço minhas suas palavras; data maxima venia, o ministro caprichou no nível da bobagem.

Dificilmente encontro um físico brasileiro que não tenha passado por uma situação dessas. Ao dizermo-nos físicos, às vezes somos recebidos com empolgação, quase admiração, de alguém que diz ter estudado física quântica, que aprendeu bastante dessa parte da ciência em seu curso de meditação, que adora como esse ramo do conhecimento confirma as bases espiritualistas de sua crença e, para coroar os comentários, pede-nos uma palavra, uma explicação e, de certa forma, uma aprovação. É uma sinuca de bico, uma situação bem espinhosa com que precisamos lidar.

Isso porque física quântica não é difícil, mas exige muito treinamento e a compreensão de muita coisa antes que se possa tentar entender seus mais básicos fundamentos. Na graduação em física somos apresentados à física quântica não antes do terceiro ano, temos que dominar uma quantidade alta de física e matemática para acompanhar a primeira equação dessa matéria e, ainda que não seja exatamente uma matéria difícil, as implicações na realidade do que as equações nos contam são estranhas, contraintuitivas, quase desrespeitosas ao senso comum. Nós, físicos profissionais, não temos a audácia de repetir nada perto do que disse o ministro, e, garanto, como escreveu Knobel, sabemos de muito mais coisa estranha que acontece no mundo do muito pequeno.

Não digo que física quântica é para poucos, mas é melhor deixada com profissionais; você pode e deve se interessar, como faz lendo esse blog, mas deve sempre ter em mente que, para realmente entender o que está acontecendo, precisa de bastante matemática e física, extraindo, portanto, seu conhecimento de profissionais respeitados da área. Não imagino como o ministro reagiria se grupos de crenças esotéricas começassem a ganhar dinheiro com termos como “o habeas corpus da alma e suas aplicações”, vendo a noção do termo jurídico ser mutilada em uma cacofonia de frases de autoajuda.

Mas não termino esse post sem comentar algo sobre física, e talvez minha parte favorita da introdução da física quântica, desmentindo o que disse no começo que não contaria nenhum fenômeno interessante. Knobel cita “Como físico, acredito em coisas incríveis, como entes que são ondas e partículas simultaneamente”, e ele escolheu esse primeiro tópico a dedo, é conhecido como “a dualidade onda-partícula” na física quântica. Foi talvez o primeiro grande empasse experimental dessa área, e a fonte de debates acalorados nos anos 20, até a invenção de um gato que estaria vivo e morto ao mesmo tempo. Essa história começa com duas paredes, uma delas com duas fendas, um físico e uma metralhadora. No caso da figura (de Arthur Vergani) que segue, Erwin Schrodinger.

schrodinger_gato_dupla_fenda

Imagine-se segurando uma metralhadora. À sua frente, uma parede com duas fendas verticais não muito grandes. Essa parede é bem resistente e a metralhadora não irá machucá-la, mas a parede que está logo depois dela, que não possui fendas, é mais frágil e ficará machucada. Você começa a atirar nas fendas, sem qualquer critério e com pouca mira. Como ficará a parede frágil que fica atrás?

A primeira parede servirá de “escudo”, deixando apenas passar balas pelas fendas. O esperado, então, é encontrar a região da parede frágil imediatamente em frente às fendas mais destruída. Ou seja, depois da saraivada de balas, sua parede deve estar com as seguintes marcas:

fenda_dupla_1

Marquei com linhas pontilhadas onde ficam as fendas da outra parede, que deixaram as balas passarem. Claro, há balas que não caem imediatamente em frente às fendas, há ricochetes, estou atirando como um maníaco nas paredes.

Isso acontece com balas, e o grande problema da física quântica é a descoberta de que elétrons não são balas. Ainda na analogia, imagine-se com uma nova metralhadora, que lança elétrons. Você metralha as paredes, e vamos imaginar, pela analogia, que as marcas deixadas nas paredes são as mesmas. Se você tivesse metralhado suas paredes com elétrons, sua parede de fundo teria uma imagem parecida com essa:

fenda_dupla_2

Vou deixar alguns instantes para você tentar digerir essa imagem.

Essa descoberta, conhecida como a experiência da dupla-fenda, chocou a comunidade científica. Não porque esse padrão era novo, pelo contrário, porque esse padrão é conhecido e pertencente a outra categoria de objeto, as ondas. Se você lançar luz por fendas pequenas o suficiente, você terá exatamente esse padrão de difração, como chamamos. Se você quer uma foto, apresento a que eu tirei quando, na faculdade, lancei um feixe laser em duas fendas bem pequenas. A figura formada do outro lado foi:

fenda_dupla_3

Esse padrão concorda exatamente com a parede metralhada por elétrons que passaram pela fenda dupla. Nessa experiência, conseguimos ver o caráter ondulatório do elétron. As ondas formam esse padrão se atravessam duas fendas, como as ondas de água formariam se a parede fosse capaz de medir a altura da água e colocássemos a parede com fendas duplas na beira do mar. Essa figura psicodélica da Wikipédia talvez ajude a ver, ou talvez desperte algum distúrbio neurológico que você ignorava possuir. As cores são a altura da água, quanto mais vermelha, mais alta:

Desde a primeira experiência com elétrons, os físicos tentaram responder a pergunta: afinal, por qual fenda o elétron passou? A onda do mar não passa por nenhuma fenda exatamente, passa pelas duas ao mesmo tempo, afinal, a onda não está em lugar nenhum, mas em vários. Ondas não possuem a nossa noção convencional de posição, e isso não assusta ninguém; mas o elétron é e sempre foi uma partícula, ele deveria passar por alguma fenda.

A primeira ideia é colocar um medidor de elétrons nas fendas. Fazendo isso, conseguimos medir a presença de um elétron e nem é preciso absorvê-lo, basta jogar algo nele que, se rebater, ele está lá. E de fato nunca teremos duas medições do mesmo elétron, ele irá realmente passar por uma das duas fendas; mas, ao olharmos para a parede no final da experiência, a figura que veremos será a da primeira parede cheia de balas, não a segunda. Como uma pegadinha cruel, se medimos por qual fenda o elétron passa, teremos o resultado esperado por partículas. Se não medimos, ele se comporta como onda! A única analogia válida, porque todas são difíceis nessa área, é aquele brinquedo de sua infância que não funcionava de jeito nenhum, aquele computador em pane que, quando seu pai chegava para consertar, funcionava cinicamente na primeira tentativa.

Com o tempo, descobrimos a intrincada complexidade dessa experiência. A perda do padrão de onda do elétron ocorre porque medimos ele e, nessa medida, damos muita energia ao garoto, que começa a se comportar de maneira diferente depois da medição. Nossa observação estraga o efeito que queremos, como abrir o forno para checar se o bolo está bom pode estragar o bolo.

Na mesma época, foram feitas outras experiências com a luz e descobriu-se que ela, muitas vezes, se comporta como partícula, quando desde muito se sabia que ela é uma onda. Aos poucos, os físicos foram chegando à conclusão de que, no mundo do muito pequeno, as coisas não são nem ondas, nem partículas. Não é muito correto dizer que são onda e partícula simultaneamente, tentando criar a ideia de um falso paradoxo e, acidentalmente, de misticismo na ciência. Mais honesto seria, talvez, dizer que os objetos muito pequenos não são ondas ou partículas, mas schrugs, um nome que acabo de inventar, mas que serve para deixar claro o fato de que eles são algo diferente do que estamos acostumados. Em algumas experiências, se comportam como ondas, em outras, como se fossem partículas, e essa é a realidade do mundo do infinitamente pequeno.

E por que haveríamos de achar uma analogia perfeita das partículas com objetos de nosso cotidiano? Que obrigação tem a realidade do nanométrico de se conformar a nossas concepções tão atreladas ao metro e ao segundo? A mecânica quântica diverge muito de nosso senso comum porque o muito pequeno, como o muito grande, não cabe em nossa imaginação; ainda bem que possuímos muitas equações confortáveis para nos guiar nesses pântanos e pradarias tão pouco familiares.

Por fim, noto que não consigo conceber onde nessa história toda há a verificação da espiritualidade de Ayres Britto. Na onda dos místicos de plantão, os que provavelmente inspiraram o ministro em sua crença, eles podem julgar que todos nós temos uma dualidade na existência, que a alma é um estado quântico, ou convolver um termo esotérico qualquer com um quântico para soarem sábios e parecerem ridículos; é fácil se aproveitar do desconhecido, do analfabetismo científico, para, em uma pajelança de termos vagos, vomitar pilantragem em DVD’s e palestras.

A física quântica nada tem de vago, nada tem de esotérico, nada tem de místico, não é bagunça, é coisa séria. É diferente do convencional, é verdade, assim como o estudo do muito grande, a cosmologia e a astrofísica, o são. Mas de nada serve, a eles, uma área da ciência sem frases de efeito, sem termos de significado obscuro que podem tornar um pilantra em um sábio em potencial (como disse em outro post, tarô quântico certamente parece mais interessante que tarô). Essas pseudociências compõem livros que forçam termos científicos a ficarem constrangedoramente justapostos a quem eles jamais conscientemente ficariam, como uma festa de fim de ano em que ninguém se conhece, sendo mais próximos de um sequestro de reféns que de um texto. Qualquer pessoa que usar termos estripados dessa área da física para justificar seu misticismo é, na melhor das hipóteses, ingênua; na pior, uma fraude.

Esperamos, portanto, que essa área da ciência se livre algum dia desse estigma, desse encosto esotérico. E também esperamos, como brasileiros, que o julgamento do ministro nada tenha de quântico, nada tenha de dualidade e nada tenha de relativo.

Nobel 2013 – O bóson de Higgs

Rookie

Hoje é um dia de festa para a física.

Há algumas horas, o CERN, Centro Europeu de Pesquisa Nuclear, anunciou a tão esperada descoberta: encontramos o bóson de Higgs. Depois de muito tempo, dinheiro e estudo, os físicos de partículas conseguiram, e hoje o dia é deles. Tenho lido bastante coisa na imprensa sobre essa descoberta, e infelizmente muita bobagem, em especial com o apelido “partícula de Deus”. De minha parte, acredito que vale a pena escrever um pequeno resumo sobre uma das aplicações do Higgs e sua importância para a física.

Para entender o Higgs, precisamos entender as forças da natureza. Todo tipo de interação acontece em uma de quatro formas possíveis: por força gravitacional, por força eletromagnética, por força forte ou por força fraca. As duas primeiras são bem conhecidas, é por elas que você é atraído pela Terra (gravitacional) mas não atravessa a Terra com seus pés (eletromagnética). As outras são menos famosas, mas igualmente importantes: a força forte é a atração que prótons e nêutrons sentem entre si, e o que torna o núcleo atômico possível; afinal, você nunca se perguntou como tanta carga positiva conseguia ficar junta? A fraca é mais sutil, ela age na desintegração de partículas e em uma boa parte do que conhecemos como radioatividade.

Essas quatro forças fundamentais possuem características muito diferentes. A forte é de alcance extremamente curto, mas muito intensa onde age, e sua forma exata ainda é desconhecida. A fraca age apenas em partículas “girando” em um determinado sentido, não em outro, como se preferisse a esquerda à direita, um comportamento muito estranho. A eletromagnética é talvez a mais bem comportada, conhecemos todas as suas leis e seu alcance, desde o século XIX ela não é mistério. A gravidade, no entanto, é a irmã bastarda das forças, resistindo a toda tentativa de unificação, sozinha, quase uma criança autista isolada em seu mundo e hostil a qualquer tentativa de se aproximar das outras. Pedi a um amigo que representasse as quatro forças em um desenho, que é um de meus favoritos:

No século XX, contudo, os físicos descobriram um passado comum entre a força fraca e a eletromagnética. Apesar de possuírem comportamentos completamente diferentes, descobrimos que, se estudamos partículas ou forças a altíssimas energias, essas duas forças são, na verdade, a mesma coisa nessa escala! Como irmãos gêmeos que depois de uma certa idade são completamente diferentes, essas forças já foram a mesma coisa, logo depois do Big Bang, quando a energia ainda era alta demais; mas hoje possuem apenas traços leves de parentesco.

Aí entra o Higgs. Essa partícula, que na verdade é mais um campo, é responsável pela quebra na simetria entre a força fraca e a eletromagnética. Em energias muito altas, elas são a mesma coisa, mas, conforme a energia vai baixando, o Higgs começa a agir e a tornar essas forças completamente diferentes.

Toda força é transmitida por uma partícula. As partículas da força fraca são os bósons W e Z, a partícula da eletromagnética é o fóton, e eles são radicalmente diferentes; para começar, W e Z têm massa, o fóton não. Isso é culpa do Higgs, por isso dizemos que ele é responsável por dar massa aos bósons, e até a mais outras coisas, porque podemos repetir esse raciocínio para explicar a existência de massa em todas as outras partículas! A presença do Higgs é a causa da separação entre a força eletromagnética e a fraca; sem ela, o universo seria um lugar bem diferente. Ele possui outras tarefas, mas talvez a mais importante seja essa, separar esses irmãos gêmeos e tornar um o bom aluno, enquanto o outro torna-se o rebelde.

A importância dessa descoberta é múltipla. Em primeiro lugar, temos nossa teoria confirmada, o que é fundamental para a ciência. Se isso fosse geografia, poderíamos dizer que há uma cidade ali, uma aqui, porque as observamos; e então dizermos: “Pelos meus estudos, deve haver uma cidade nas coordenadas 21º43’19”S, 44º59’06”W”, viajar e descobrir lá uma cidade, nunca antes observada, encontrando cidades e povos apenas porque sua geografia estava correta, porque a teoria está certa.

Em seguida, podemos aprofundar o estudo dessa partícula para desvendar outros mistérios, como o que é massa? Como a gravidade (que atrai massas) funciona? Por que a mesma massa que usamos para calcular a resistência a ser acelerado (aquela do $F = m.a$) é a mesma que serve para dizer o quanto um corpo atrai o outro? Como escrever a gravidade nessa linguagem de partículas? Pode o Higgs nos ajudar a entender toda aquela parte de matéria escura e energia escura que nos desafia e fascina, sem nos dar pista nenhuma?

Para mais detalhes, há um vídeo excepcional produzido pelo PhD Comics, de onde tirei a imagem inicial do post, que explica as dificuldades em medir o Higgs e que surpresas ainda nos aguardam.

Assim, parabenizo os físicos de partículas, em especial os experimentais, hoje o dia é de vocês. Uma vitória para os físicos, e para toda a ciência, que avançou mais um pouquinho na compreensão do universo, na busca pela verdade; uma pequena partícula para o CERN, um grande passo para a humanidade. E dou boas-vindas ao Higgs a nossa lista de partículas elementares, o tão esperado bóson que, depois de tanto fugir e se esquivar, cansou e voltou para casa.